“Identidade e Família”: Um retrocesso  civilizacionalÂ

“Identidade e Família”: Um retrocesso  civilizacional 

A recente publicação “Identidade e Família” procura revisitar conceitos de família tradicional e papéis de género na sociedade portuguesa de 2024. A obra, composta por 22 contribuições de diversas figuras conservadoras, peca por promover uma visão retrógrada que limita o papel da mulher a meras funções domésticas e de submissão, enquanto promulga uma narrativa perigosamente alinhada com os aspetos mais opressivos do pensamento judaico-cristão.

É alarmante perceber como, em pleno século XXI, ainda existem tentativas de impor um modelo de sociedade onde a mulher é relegada ao lar, sob o pretexto de ‘valores familiares’ que mais parecem saídos de um manual de outra era. Este tipo de conteúdo não só ignora as lutas e conquistas sociais das últimas décadas em termos de igualdade de género, como também tenta erodir esses avanços, sugerindo o regresso a uma ordem social antiquada onde as mulheres são vistas e tratadas como inferiores.

A obra vai além da sugestão de uma preferência pela família tradicional, chegando a criticar e diminuir outras formas de organização familiar que, comprovadamente, podem ser igualmente saudáveis e harmoniosas. Famílias monoparentais, uniões de facto, e outros arranjos modernos são descartados ou ignorados, como se a felicidade e a estabilidade pudessem ser alcançadas apenas dentro de um modelo restritivo e obsoleto.

É também preocupante o tom usado por alguns dos colaboradores do livro, que evocam a religião como uma ferramenta de pressão social e de controlo, ao invés de um meio para o desenvolvimento espiritual pessoal e inclusivo. Tal abordagem não apenas exclui aqueles que seguem diferentes crenças (ou nenhuma), como também desrespeita a pluralidade e diversidade que caracterizam a sociedade contemporânea.

O livro representa um claro retrocesso civilizacional, uma tentativa de reprimir a evolução social e manter estruturas de poder desequilibradas que beneficiam apenas uma parcela da população. Em vez de promover um diálogo construtivo sobre os desafios reais enfrentados pelas famílias hoje, opta por idealizar um passado que, na realidade, nunca foi benéfico para todos.

Ao analisar “Identidade e Família”, é essencial que leitores mantenham um olhar crítico, reconhecendo a importância de defender a igualdade, o respeito e a diversidade como pilares de uma sociedade verdadeiramente democrática e justa. Este livro não é apenas uma representação de uma ideologia ultrapassada; por isso, requer vigilância e ativismo contra as correntes que procuram acabar com os progressos pelos quais tantos lutaram incansavelmente.

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